Espelho, espelho meu… quem manda no meu corpo sou eu!

Meu nome é Cinderela… (pausa para vocês dizerem \”Oi, Cinderela\”) tenho 35 anos (quase 36) e sou viciada em açúcar.
Tudo começou quando ainda bem pequena os meus amiguinhos me apresentaram à Venda da Dona Tereza, ao lado de casa. Aquela vendinha parecia a casa da bruxa da história de João e Maria (crianças adoráveis, diga-se de passagem, mas que se perderam por conta do vício). Ali podíamos encontrar desde aqueles guarda chuvas feitos de chocolate vagabundo até as deliciosas tetas de nega. Uma verdadeira boca para um glicodependente (acabei de inventar!).
Mas até casar com o Príncipe Encantado eu era só uma consumidora \”normal\” de açúcar, consumia socialmente e quase nunca comprava, não sentia mesmo falta, se tinha eu comia, senão não.
No entanto, durante o casamento real não me dei conta de que não estava feliz e comecei a usar o açúcar para tapar os buracos não preenchidos pelo meu relacionamento. Mas ainda assim não era uma usuária super frequente ou compradora.
Quando me separei é que o problema começou. Não sabendo lidar com as minhas emoções, aliás, nem reconhecendo algumas delas, acabei usando o açúcar como remédio. E não precisávamos, de verdade, de nenhuma pesquisa científica para saber o prazer que dá comer um chocolate, um bolo de chocolate ou um sorvete de chocolate (meu \”sabor\” de açúcar favorito, no caso).
Comecei a parar pra comprar doce pra levar para casa ou até a sair de casa somente para comprar doce. Pra piorar, na filha da puta da última escola que eu trabalhei (digo isso com todo meu amor e carinho rs) só tinha gente maravilhosa fazendo e levando quitutes para serem compartilhados. Claro, vamos todos usar juntos, ninguém quer ser viciado sozinho, não é mesmo!?
Depois de um tempo me espantei ao perceber no espelho as diferenças no meu corpo, de quando me casei e agora. Entrei em choque! Como uma boa Cinderela com Complexo de Perfeição eu podia dizer que algumas celulites estavam, no mínimo, no lugar errado.
Declarei guerra ao açúcar, tendo vivido intensas batalhas de amor e ódio nos últimos quatros anos, as quais eu acreditei terem chegado ao fim, quando na minha primeira resolução de ano novo tivemos uma abrupta decisão de separação – eu e ele.
Não, não era mais somente pelo meu corpo, era pela minha mente também. Quanto mais açúcar, mais eu penso, mais agitada eu fico, menos eu durmo e mais merda eu faço. Então eu pensei que, embora ainda esteja aprendendo a lidar com as minhas emoções, agora eu já consigo reconhecê-las, o que me dá uma vantagem enorme na vitória contra esse meu inimigo.
E assim eu o fiz. Depois da passagem do ano segui sem ele, disciplinadamente, como já havia feito outras vezes.
Quando então, numa noite de intensa ansiedade propiciada pelo meu inferno astral, eu sucumbi aos deleites do meu inimigo. Mas pera, vamo lá! Não foi como vocês estão pensando, não foi assim descontroladamente. Eu sabia da minha ansiedade e pensei \”abro a lata de leite condensado que sobrou do Natal para curtir esse filminho e dar uma relaxada ou não?\”. Decidi por abrir. E apesar de ter sido uma decisão consciente e não ter comido nem metade (o que é um grande feito!) me senti um pouco culpada. Mas sabia que no dia seguinte poderia começar tudo de novo, com toda a minha disciplina.
E é então que a vida mostra que você não pode fugir de quem realmente é.
No dia seguinte eu tinha uma festa e ao final tive que trazer uns 12 pedaços de bolo de chocolate que sobraram pra casa. Sim, eu tive, porque se tem algo que vovó me ensinou muito bem foi a não desperdiçar comida, não importa que ela seja feita de açúcar. No outro dia fui assistir filme na casa de uma amiga. Mal sentei ela já falou \”amiga, tem uma lata de leite condensado, só pra avisar rs\”. E no dia depois desse uma outra amiga me liga e diz \”tá em casa? Tô passando aí pra deixar um arroz doce que eu fiz pra você, mas eu fiz com pouco açúcar porque sei que você não gosta.\”.
Oi? Eu não gosto? Eu amo essa porra! Não consigo viver longe dele e nem ele de mim. Dá até tristeza de ver a cara dos brownies trazidos do trabalho pelo meu roommate me encarando em cima da mesa, sabendo que eu os quero e eu saindo da cozinha sem pegar nem um pedacinho. Isso é mais lamentável do que ver algumas gordurinhas mal localizadas. É também lamentável ser a visita chata que não come o bolo feito com todo carinho pela amiga. E mais lamentável ainda é ficar comparando o meu corpo com o de outras pessoas. Isso sim é triste!
Não estou ignorando o mal que ele é capaz de fazer, mas é muito pior os efeitos da comilança desembestada fruto de uma abstinência do que o consumo normal ao qual estava acostumada antes de me perder entre o mundo das emoções descontroladas e do estereótipo de beleza fitness cada vez mais exigido pela mídia. E afinal de contas, aquela academia também tem que servir para alguma coisa além de me dar músculos para sustentar um esqueleto com mais 30!
Depois de perceber tudo isso resolvi reatar e assumir o nosso romance, parando de enxergar o açúcar  como meu inimigo, com grandes esperanças de que possamos respeitar os nossos espaços e nos apreciemos como antes, socialmente, de vez em quando, em momentos de lazer e tentando evitar os encontros noturnos para que eu possa ter uma tranquila noite de sono. E quando o espelho quiser me dizer para largá-lo, como uma boa aquariana do contra que sou, vou olhar bem na cara dele e dizer: quem manda nessa porra sou eu!

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