Paizinho

Faz duas semanas que você se despediu de mim no aeroporto, deixando no meu coração um vazio imenso. Me fez querer pegar o primeiro vôo de volta pro Brasil. Mas sentada lá num banco, esperando o meu choro acalmar pra poder pegar o Airtrain de volta pra Jamaica Plain, lembrei de você me dizendo pra ter calma, pra não fazer nada com pressa. E apesar de essa saudade me doer o peito me fazendo querer um remedinho pra passar (eu que nem sou de tomar remédio!), sei que você está certo. Parece que já vivo aqui há tanto tempo e tanta coisa mudou nesse nosso país que ele se tornou um lugar no qual não consigo me imaginar morando mais. Poderia mesmo ser só um país estrangeiro cujo nome tem a letra Z no meio, se não fosse por você e por essa família que tanto amo… Talvez sabendo disso, sabendo da minha ansiedade e do meu jeito de tomar decisões por impulso às vezes, é que você diz pra eu ter calma. Então não tenho outra opção, senão a de esperar a dor da despedida passar.
Mas cada dia após a sua partida me trás uma lembrança. As noites assistindo Ninja versus Ninja tornaram-se umas das minhas favoritas nas memórias das alegrias simples do cotidiano. A sua curiosidade e a sua vontade de aprender algumas palavras em inglês pra não sentir vergonha quando alguém falar com você e tentar se virar sozinho me surpreenderam e me encheram de orgulho. Orgulho esse que fiz questão de declarar no dia do jogo do Red Sox, quando enchemos a cara e conversamos sobre o que fizemos e estamos fazendo das nossas vidas – uma das coisas que mais sinto falta aqui, nossas conversas, com suas histórias da vida, tomando algumas lá na chácara. Com exceção do fato de que nunca bebi tanto na chácara a ponto de passar mal e você rir de mim vomitando pra todo lado, aquela noite de verão em Boston poderia facilmente ter sido uma das nossas de fim de ano em Avaré.
E cada dia me surpreendo mais em como somos parecidos. O mesmo jeito imprestável de ressaca no dia seguinte depois de ter tomado mais do que devia rs. O nosso cansaço e falta de animação para fazer compras, embora você tenha feito muitas, como nunca fez na vida, o que me deixou bem feliz, pois você merece muito. O nosso jeito inconformado ás vezes de discordar sobre a política do país. A falta de paciência em algumas horas e aquela leve vontade de dar um soco em alguma coisa, definitivamente adquiri de você rs. O medo de mudar ou a demora pra me adaptar a mudanças, demorei pra descobrir (claro, porque sou lenta né rs), mas acho que isso também é seu. O que cada dia mais eu entendo, acho que toda pessoa meio doida precisa de uma certa rotina pra organizar a vida e quando isso muda leva um tempo pra acostumar e se encaixar na nova situação.
Foi assim que me preparei pra sua chegada, uma maravilhosa mudança de rotina. E aproveitei cada minutinho da minha vida aqui com você. Acordar com o cheiro do seu café forte de manhã ou com você acordando a gente pra tomar café juntos, porque você madrugou já faz um tempo e está entediado querendo companhia rs. O seu jeito de não sorrir pra tirar foto, o que foi notado inclusive pela hostess do restaurante em Salem rs. Mas nesses 14 dias você sorriu mais do que eu esperava, mais do que eu já vi você sorrir em uma vida talvez. Você parecia bem feliz com essa mudança de rotina. Tão feliz que finalmente percebeu que, apesar de longas caminhadas pra conhecer tudo (e uma ponte interminável chamada Brooklin rs), existe toda uma vida fora da sua vida habitual, um mundo inteiro esperando pra ser descoberto por você. Sim, você merece sorrir assim todos os dias da sua vida!
Hoje é Dia dos Pais aí nesse Brazil (agora com Z pra mim) e só o que desejo é ver você sorrir mais para a vida assim, esse sorriso de felicidade que nem sabe que tem. Que você se permita mesmo se presentear conhecendo o mundo afora. Você já consertou muito buraco por essa São Paulo, tá na hora de começar a explorar fora deles. Não se preocupe, não faltarão coisas para serem consertadas e trabalhos manuais para serem feitos. Sempre haverá uma Havaiana arrebentada pra colocar um prego. A minha arrebentou dois dias depois que você foi embora. Levei mais de uma semana pensando que se tivesse acontecido antes de você vir eu poderia ter pedido pra você trazer uma nova pra mim. Só na sexta me lembrei de você consertando a da Sú aqui em Boston. Então me lembrei também de tantas outras consertadas na nossa infância, resultado de se ter quatro filhos e uma infância humilde, mas bem feliz. Consertei a minha ontem, até que a nova chegue. Ficou perfeita!
Obrigada por ter me ensinado a consertar a minha Havaiana pra poder seguir caminhando livre por aí. Obrigada por tantas outras coisas que fariam essa carta ficar maior ainda se eu dissesse. Hoje é Dia dos Pais, mas como eu te disse muitas vezes aqui, quando você insistia em me dar algum presente, você é o meu presente e quem ganha algo hoje sou eu!
Que mesmo longe possamos celebrar esse presente na minha vida por muitos e muitos anos!
Te amo, paizinho…

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