Assim que me tornei a adolescente perfeita, nerd e chata decidi que estudaria em uma das melhores universidades do país. Não sei bem se foi uma decisão estimulada por professores, se estimulada pela minha baixa autoestima, que precisava sempre provar algo para os outros, ou um pouco dos dois. Só sei que por conta dessa decisão escravizei e cobrei a mim mesma durante três anos depois de me formar no Ensino Médio.
Coloquei o objetivo de estudar em uma faculdade pública, de preferência a melhor do país, como uma necessidade tão grande que deixei de viver o presente e perceber os presentes que a vida me apresentava naquele tempo.
No ano em que me formei eu prestei vestibular para uma faculdade particular onde gente normal, e não bitolada como eu, estudava, mas não quis me matricular, porque, obviamente, eu era especial e haveria de enfrentar todas as bruxas e dragões para chegar à tão desejada USP.
Com meus pais sempre trabalhando e minha mãe cuca fresca segui sem fazer nada naquele ano depois de me formar, literalmente nada. Hoje penso onde estava a minha ansiedade naquela época, sério! Quem consegue ficar sem fazer nada durante tanto tempo?
Bom, quase no final do ano, a minha mãe finalmente me fez a proposta de ir com ela visitar o meu irmão mais velho na Califórnia e ficar lá pelo tempo do visto. Eu estava namorando sério o primeiro boy da minha vida, mas passar um tempo nos Estados Unidos era um sonho que eu cultivava já há alguns anos. Sem nem parar pra pensar disse \”claro!\”. Dei tchau para o boy, deixei ele chorando no aeroporto e parti com a minha mãe para a \”terra prometida\”.
Comecei a me apaixonar por esse país assim que entrei no avião. As comissárias de bordo falando ao vivo e a cores a língua que eu tanto assistia nos programas da Tv à cabo e os filmes todos em inglês, sem legenda, na tela posicionada no encosto do banco à minha frente constatavam o meu sonho se tornando realidade.
Não precisei de muitos dias quando cheguei para achar que a vida que o meu irmão levava era maravilhosa. Ele morava perto da praia em um condomínio que parecia um clube. Os meu olhos brilharam quando ele nos levou para assistir um jogo de Futebol Americano numa high school. Eu estava mesmo dentro de um filme de Hollywood.
Em poucos dias já havia arrumado um trabalho de babá. Era só por uns dias, mas mesmo assim o meu irmão disse que não tinha problema, que eu não deveria me preocupar, ele me ajudaria enquanto eu estivesse lá com ele.
Mas, conforme os dias foram passando e o dia da volta de mamãe e oficialmente a minha chegando, um medo do inesperado e o apego pelo que havia deixado no Brasil – a idéia da USP e o boy – me fizeram arrumar as minhas malas e deixar outro boy chorando no aeroporto, dessa vez o meu irmão.
Voltei, terminei com o boy, estudei três anos para entrar na bendita faculdade e desisti depois de dois e meio, após perceber que o curso não era pra mim. E assim a minha vida continuou, entre ideias fixas e algumas mudanças, sem perceber que eu estava mesmo era tentando me encontrar. Casei, me matriculei em outras duas faculdades. Finalmente me formei. Passei num concurso e comecei a dar aula – outra ideia que coloquei na minha cabeça, a de ser professora.
No final de tudo não estava feliz. Mas levou um tempo para perceber isso e também para me desapegar disso. Consegui desapegar do casamento, do trabalho estável e louco como professora e a vida acabou me trazendo de novo para morar nesse país. E, apesar do frio de Boston e de todas as adversidades que enfrentamos para viver aqui, me apaixonei à segunda vista pela América novamente. Na verdade, acho que eu e ela temos uma história de outras vidas rs.
No entanto, há uns três meses atrás comecei a sentir que faltava algo nessa nossa relação. Não sabia dizer o quê, porque sempre me senti feliz aqui. O próprio inverno gelado de bater os dentes (e de quebrar alguns ossos escorregando na neve rs) do qual aprendi a gostar e apreciar, já me parecia muito mais longo e deprimente. A Viagem para Flórida no meio dele talvez tenha feito a diferença e mexido com os meus botões interiores que queriam acreditar verdadeiramente que eu, garota do verão, poderia ser feliz em um lugar com sete meses de frio no ano, com gente mais fria, bem eu – uma pessoa de pessoas. De repente me dei conta de que já não estava mais tão feliz assim. Foi algo de dentro pra fora, um sentimento inexplicável e uma voz me dizendo \”o que você tá fazendo, garota? Tem um mundo inteiro lá fora, você é do mundo esqueceu? Ainda tem muita coisa pra ver e gente pra conhecer, tá doida?!\”.
O fato é que estava me apegando de novo a uma ideia, assim como o casamento perfeito com o Príncipe Encantando, assim como estudar na melhor Universidade do País, não importa o quanto possa parecer bom e até seja muito bom em muitos momentos, só não é… para mim.
Acredito que aprender a desapegar seja uma das lições que mais tenho aprendido nessa minha vida de América e por ela, e muitas outras coisas, sou muitíssimo grata. E é também por ela que vou me despedindo aos poucos, vivendo o que ainda tenho pra viver aqui e me preparando para a próxima fase da aventura da minha vida, afinal ela é curta e não tenho mais tempo para ideias fixas.
Aliás, já tem um tempo que só tenho tempo para ser feliz e quando você decide ser verdadeiramente feliz não tem mais volta, é libertador! Portanto, desapega!