Foi depois do meu último relacionamento, com um narcisista abusivo – (alerta de redundância intencional), que senti necessidade de repensar minha vida sexual.
Logo na primeira noite com ele percebi que havia algo errado. Mas não questionei a mim mesma, atendi aos clamores de desejo mútuo e transamos, afinal era livre e já há algum tempo desprovida dos conceitos machistas que antes me cobravam um comportamento quase angelical se esperava que o cara não me visse como uma mulher \”fácil\”.
Entretanto, ele acelerou o passo da relação com intensidade e identificar alguns hábitos sexuais em pouco tempo não foi difícil. Dentre eles uma forte preocupação em diversificar posições. Com o passar do tempo e a minha naturalidade durante o sexo ele relaxou e passou a ter dificuldades para segurar a ejaculação.
\”Está me incomodando que eu não esteja mais conseguindo me controlar com você. Precisamos fazer outras posições\”, ele disse. Rindo, sem perceber a seriedade do que se escondia por trás de suas inquietações, afirmei que o problema dos homens é que eles aprendiam a transar assistindo pornô e que não havia a necessidade de trocarmos de posição, nem de controlar o momento, já que havia vontade e naturalidade.
No fim da relação acabei por atestar minha hipótese, ao ver a quantidade de filmes pornográficos que ele mantinha no fundo do guarda-roupas. Contrariado pela minha observação, dessa vez agressivo, disse \”e você aprendeu a transar como?\”. \”Transando\”, respondi.
Após aquele breve diálogo sucederam-se três dias de claro comportamento abusivo, caracterizado por chantagens, ofensas, mentiras, alterações de humor e outros, que me levaram a colocar um ponto final sofrido e definitivo no relacionamento.
Mas a energia deixada pelo convívio, principalmente quando eu me lembrava do sexo com ele, me dava náuseas. Confesso que ainda estou me libertando disso e, desde então, tenho optado de forma cautelosa por conhecer melhor as pessoas antes de trocar minha energia sexual, que considero cada vez mais sagrada (sem conotação religiosa), com alguém que desconheço.
Porém, olhando para a minha adolescência lembrei que não aprendi a transar somente através de relações sexuais. A curiosidade depertada pela descoberta da sexualidade na infância levou a mim e ainda leva inúmeros jovens a buscar na pornografia um meio de suprir a falta de informação que nos é negada pelos desdobramentos do tabu sexual.
Até esse último relacionamento eu ainda acreditava de certa forma que assistir a um pornô não tinha nada demais e era somente uma expressão da minha liberdade sexual.
Mas, ao contrário do que se pensa, esse gênero de filme não quebra padrões de repressão sexual. Sequer explica algo sobre sexualidade. Na realidade estabelece padrões fantasiosos que colocam a mulher como um objeto de manipulação e satisfação masculina e faz com que homens acreditem que devem cumprir um roteiro de posições e muitas vezes de agressões como referência de boa performance e superioridade. Assim, o ato sexual deixa de ser um momento de troca e conexão real entre os parceiros e passa a ser somente uma tentativa de obtenção do prazer pelo uso do corpo do outro.
As consequencias disso podem ser variadas: reforço do machismo e da objetificação feminina, necessidade de fantasiar para obter prazer, dificuldades de satisfazer-se com parceiros em situações reais, impotência, violência e abusos físicos e psicológicos, vício sexual e em pornografia, dentres outras.
Quantas de nós acreditaram que um tapa na bunda, a mais \”simples\” e naturalizada das agressões durante o sexo, era normal? Mesmo sem sentir prazer algum naquilo? Quantas vezes nos sentimos horríveis depois de transar com alguém pela primeira vez? Já se perguntou com honestidade quantas vezes fez sexo só porque já estava lá ou porque isso era o esperado de nós, já que somos livres? Até que ponto somos realmente livres para expressar nossa verdadeira sexualidade? Qual é a nossa real sexualidade?
Há uma grande expectativa criada sobre o corpo feminino baseada na falta de uma educação sexual que trataria a sexualidade com naturalidade e não como condição puramente animal do ser humano relacionada ainda com conceitos cristãos de pecado.
Enquanto sexualização não for devidamente diferenciada de sexualidade continuaremos na corda bamba da estigmatização entre putas ou santas, assistindo a nossa liberdade ser usada contra nós, sendo classificadas como material de diversão ou casamento, sofrendo abusos de diversas formas, reprimindo nossa libido ou acreditando que o sexo pelo sexo é a melhor forma de estimulá-la.
Até que os viéses dessa discussão sejam um assunto de real preocupação social tratado de forma educacional ainda na adolescência teremos que apelar para a boa e velha intuição e nos questionarmos de forma sincera a cada date: será que quero mesmo transar com esse cara hoje?
Não há nada de errado no One-Night Stand. Não estou dizendo que nunca mais transarei com alguém no primeiro encontro. Mas pretendo continuar tomando essa decisão de forma consciente. Sentindo se aquela pessoa é capaz de respeitar meu corpo, meus limites e me enxergar como um ser humano e não como uma boneca inflável.
Isso não é romance, não se trata de esperar daquela noite um relacionamento. Escolher de forma questionadora SE e COM QUEM queremos passar a noite é o mais profundo significado de liberdade sexual, é, além disso, troca, conexão e respeito!